SELVA DE SANGUE E CIMENTO
Tens cerca de 12 anos. És miúdo da rua. Creceste por aí, de acordo com as leis da Selva de sangue e cimento e vais sobrevivendo... tens até uma navalha no bolso... pedes por vezes, roubas a maior parte delas, secalhar passas droga para ganhar uns trocos... talvez até te prostituas...
Tens um irmão de 5 anos e entraram no autocarro sem pagar... Olho a tua expressão endurecida de criança que já viveu muito... Divides um chocolate com o teu irmão... Observas atentamente as paragens para ver se vês o "pica" e aproveitas para sondar as malas em teu redor...
Reparo nos teus olhos de gelo, de quem sabe a regra do "eu ou os outros". Trocas um olhar comigo, muito rápido, muito frio, muito indiferente... Faço parte de tudo contra o que tens que lutar diariamente e todos os dias são para ti uma batalha a vencer... És menino-homem à força...
Mas vejo também todo o carinho com que afastas da testa os cabelos sujos do teu irmão e com que lhe dás o chocolate quase todo e no fim lambes o papel... e vejo o cuidado com que lhe dás a mão para sairem na paragem seguinte. E sempre que olhas para ele tens o teu olhar meigo de criança, que ainda és.
Sais. Tenho vontade de fazer qualquer coisa, mas não faço. Tenho vontade de ir atrás de ti, mas não vou... e tenho vontade de chorar, mas não choro... As minhas boas intenções não chegam... sou cobarde demais para agir. E tu vais continuar a roubar, a pedir, a lutar... talvez até uses a navalha contra alguém um dia... talvez até contra mim... e talvez eu até o mereça, sabes? Porque tu vais continuar a viver assim e eu não fiz nada! E vais ensinar ao teu irmão as leis da Selva de sangue e de cimento... e eu... limito-me a fazer parte dessa selva...
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MCB 92
Mas vejo também todo o carinho com que afastas da testa os cabelos sujos do teu irmão e com que lhe dás o chocolate quase todo e no fim lambes o papel... e vejo o cuidado com que lhe dás a mão para sairem na paragem seguinte. E sempre que olhas para ele tens o teu olhar meigo de criança, que ainda és.
Sais. Tenho vontade de fazer qualquer coisa, mas não faço. Tenho vontade de ir atrás de ti, mas não vou... e tenho vontade de chorar, mas não choro... As minhas boas intenções não chegam... sou cobarde demais para agir. E tu vais continuar a roubar, a pedir, a lutar... talvez até uses a navalha contra alguém um dia... talvez até contra mim... e talvez eu até o mereça, sabes? Porque tu vais continuar a viver assim e eu não fiz nada! E vais ensinar ao teu irmão as leis da Selva de sangue e de cimento... e eu... limito-me a fazer parte dessa selva...
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MCB 92
6 Comments:
Nome?
João ou António ou Mamadu ou Baldé.. ou Felizberto...
Mãe?
Maria....Morreu quando eu era miúdo.
Nome do pai?
....Não sei. Não conheci o meu pai, cresci com a minha avó, ou a minha tia, ou irmão mais velho...Ou num isntituto qualquer..
É assim a realidade de muito miúdo de rua.
Desses que matam outros seres em grupo, de forma incomprensível...
Atingiram aos 12, 13, 14 anos uma maturidade que não iguala a nossa em nada...
Até na capacidade de ferir são mais .... amadurecidos...
E nós?...
Continuamos a lavar as mãos.
Sem ter a intenção de elevar ou denegrir a imagem de qualquer sistema político, quando li este texto da Morgana recordei-me de duas coisas:
daquela música do Milton Nascimento "Porque vocês não sabem do lixo ocidental";
e do livro de Jorge Amado "Capitães da Areia".
Estes miúdos são de facto capitães, nesta guerra pela sobrevivência, na selva de lixo que contruimos.
Uma dura realidade!!!
Depois dum texto destes como te fazer duvidar que a terra gira ao contrario e que os rios nascem no mar??
Neste momento envergonho-me, por ter momentos em que fujo da realidade, acredito que a terra gira ao contrario e os rios nascem no mar... mas não me mexo para que crianças possam ter mais que simples sonhos.
Um beijo de um Louco, até outro momento...
OBS: Gostei de conhecer o teu cantinho..
Nesta selva todos somos culpados e todos somos inocentes.
Que fazemos nós? fazemos queixa, metem-se as assistentes sociais e as comissões de protecção de menores.
Institucionalizam-se os menores. Mas que se ganha por aí nos moldes em que a maioria delas funciona?
A dura realidade é esta. Enquanto as mães limpam as casas e cuidam dos filhos de quem lhe paga, os delas ficam e correm as ruas deprotegidos a crescerem por eles próprios e com as leis dos que já nela habitam há muito.
É só um comentário de uma descrente no sistema.
Uma beijo feiticeira e um resto de bom domingo
Se os rios correm para o mar
Ao v~e-los eu adivinho..
Já nada os fará mudar!
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