DESAFIOQUEM É O POETA QUE TENTEI IMITAR?Vou contar-vos um episódio da minha vida que deu origem a este poema:
Um amigo meu - que por sinal me ajudou imenso a conhecer muitos poetas portugueses- tinha por hábito dizer que os meus poemas eram fraquinhos (e até eram) e que fulano ou cicrano, esses sim, é que eram poetas a sério! Então o XXX é que era um poeta por excelência, que maravilha de poeta e que tomara eu um dia conseguir escrever assim...
Ora eu que até concordava, comecei no entanto a aborrecer-me com a insistência, e como acho que a vingança é um prato que se come frio, não fiz mais nada: li e reli poemas do dito poeta - grande poeta por sinal - sempre de dicionário em punho - e comecei a tentar apanhar o estilo.
Pela primeira vez na minha vida, fiz um "poema de encomenda" ou seja, a deixar transparecer um estado de espírito que não correspondia ao meu, a usar palavras que não costumava usar, só com o intuito de tentar imitar o melhor possível o tal poeta.
Passados uns dias e tendo aperfeiçoado o poema o melhor que pude, escrevi-o numa folha sem colocar o nome do autor e mostrei-o ao tal meu amigo:
- "Olha...antes de me ir embora, vê lá se conheces isto.
- ...Isto? (...) Onde é que arranjaste isto? Isto é XXX!!! É muito bom! Eu nunca tinha lido em lado nenhum este poema dele! E olha que eu tenho os livros todos do XXX!!! Onde é que o arranjaste? "
Eu sorri, tirei-lhe a folha das mãos, assinei o meu nome no canto inferior direito da página(como costumo fazer) e fui-me embora, não sem antes olhar para trás e me deliciar com a expressão dele.
Como o escrevi sem o sentir, dei-lhe um título de que não gosto - "Medo".
Gostava que me sugerissem outro melhor e (claro) que tentassem adivinhar qual é o tal poeta português, que pelos vistos consegui imitar.
Deixa-me! Vai-te daqui, monstro tenebroso!
Sinto á minha volta tuas garras aceradas
que espasmam, em minhas mágoas viciadas,
como tu, de minhas lágrimas sequioso...
Tua eflúvia sombra paira em meu fado...
chicoteiam-me tuas asas desgrenhadas
de negro abutre, de demónio alado,
espectro de mil cabeças encapuçadas...
e dos meus flébeis olhos esmaecidos
vislumbro os teus chispantes, enquanto espreitas...
oiço os teus gritos disformes, enfurecidos
e rodopio entontecida em brumas de suspeitas...
E tu alimentas-te sôfrego de minha dôr...
é meu frágil corpo inerme o teu manjar...
são meu medo e meu sufoco, teu esplendor...
...se eu ao menos soubesse como te enfrentar...
mas tu deixas-me a sangrar na incerteza...
Vai-te ou mostra-te! esfaimado personagem!
pois eu já sei que sou a tua presa
mas não posso lutar com uma miragem...
Sómente se me revelares tua identidade
me poderei defender de tuas investidas...
e juro que te farei definhar, sem piedade
putrefacto e gemebundo em névoas enegrecidas...
MCB 92